Durante os dias de folia de carnaval, é comum encontrar pelas ruas crianças que acompanham os pais em trabalhos feitos na rua, como venda de bebidas ou comidas. Essas situações, além de representarem riscos para as crianças, podem ser entendidas como trabalho infantil pela Justiça do Trabalho. Com o objetivo de conscientizar a população, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1), do estado do Rio de Janeiro, lança nesta quinta-feira (15) a campanha Carnaval sem trabalho infantil, com trabalho seguro e sustentável.
“A gente percebe, nessa época de folia, passando pelos blocos, muitas pessoas que vão como ambulantes, principalmente, acompanhados dos filhos pequenos. Percebemos um problema social nessa faixa empobrecida da população”, disse o desembargador José Luis Campos Xavier, gestor do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem do TRT-1.
Segundo Xavier, as crianças, muitas vezes, ficam a jornada inteira com os pais fora de casa. “Se o pai, ou a mãe, ficar de manhã até a noite vendendo bebidas, sobretudo alcoólicas, as crianças ficam expostas a todo tipo de situação, como calor excessivo, falta de alimentação adequada, sem hidratação, afirmou o desembargador.
Na avaliação da Justiça do Trabalho, isso vem aumentando em grande escalada nos últimos anos, devido ao empobrecimento de uma faixa da população, que muitas vezes se vê essa como a única opção para buscar o sustento. “O que a gente quer é conscientizar a sociedade de que esse tipo de trabalho é irregular e ilegal e, também, que seja um alerta para os pais”.
Caracterização
Para o TRT-1, o fato de as crianças acompanharem os pais já caracteriza trabalho infantil, ainda que elas não estejam vendendo nenhum produto. “O simples fato de acompanhar o pai, para nós, já caracteriza trabalho infantil, ainda que não seja o trabalho direto”, ressaltou Xavier.
“E a sociedade finge que não vê. Por isso, a importância desta campanha, porque a gente percebe isso não só no carnaval, mas em outras épocas do ano. Só que, no carnaval, fica muito evidenciado, com a cidade cheia de turistas, muita gente na rua, muitos foliões, muito comércio ambulante.”
Acolhimento
A 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), acolherá filhos de vendedores ambulantes durante nos desfiles do carnaval 2024, no Sambódromo. O projeto é parceria da juíza Lysia Mesquita, titular da 1ª Viji, e da Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro.
Denúncias
O evento carnavalesco simbólico, promovido pelo TRT-1 nesta quinta-feira, convida outras entidades da mesma área de atuação a participar. Entre elas, a Defensoria Pública, Ministério Público do Trabalho. Durante o carnaval, o tribunal terá plantão judiciário para intervir, se for o caso. Todas as ligações envolvendo trabalho infantil podem ser feitas gratuitamente para o Disque 100. “É um telefone compartilhado, multissetorial, e tem vários órgãos do poder público que podem intervir diretamente nesses casos, inclusive o próprio TRT”.
Campanha
O evento contará com a participação da Bateria Fina Batucada, patrocinada pelo Sindicato dos Servidores do Judiciário Federal (Sisejufe) e formada majoritariamente por mulheres, servidoras do tribunal, que prestará apoio com o fornecimento de carro de som e apresentará marchinhas de carnaval e sambas.
Haverá também distribuição de ventarolas impressas com o Disque 100, canal que recebe denúncias sobre violações dos direitos humanos. A bateria existe há cerca de dez carnavais e, todo ano, ela faz abertura do desfile das campeãs no Sambódromo, chamando atenção para a questão da inclusão social no carnaval.
Erradicação
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de crianças em situação de trabalho infantil se aproxima de 2 milhões no país.
“Estamos falando de 1% da população brasileira. É um número bem expressivo”, disse o desembargador. Ele ressaltou que o país tem o compromisso de erradicar o trabalho infantil até 2030.
“Corremos contra o tempo. Na nossa concepção, qualquer criança que a gente consiga tirar do trabalho infantil, ainda que seja apenas uma, já faz muito sentido. Mas a ideia mesmo é trabalhar pela erradicação. É nesse ponto que estamos batendo muito”.
O TRT-1 não recebe diretamente denúncias de trabalho infantil, mas processos envolvendo essa temática. Xavier afirmou que o trabalho infantil é, muitas vezes, silencioso, e só vem a ser descoberto na fase adulta. Situações de trabalho doméstico, por exemplo, só vêm à tona quando a criança, já na maioridade, busca o poder judiciário.
Às vezes, a criança vive em situação análoga à escravidão, sem acesso à educação e a convívio social. Para o TRT-1, lugar de criança é brincando ou na escola; nunca trabalhando. “E o fato de ela não estar na escola nem brincando prejudica o próprio desenvolvimento social dessa pessoa no futuro”.
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